Entre as vacinas que apresentaram maior queda está a da poliomielite, ou paralisia infantil
Desde 2015, o Brasil sofre com quedas constantes na cobertura vacinal de crianças, situação que ficou ainda pior nos últimos dois anos devido à pandemia de Covid-19. Dados do Sistema de Informação do PNI (Programa Nacional de Imunizações), de 2021, mostram que entre as 15 vacinas que fazem parte do calendário do Ministério da Saúde, pelo menos nove tiveram uma queda brusca nas aplicações.
Apenas dois imunizantes – a tríplice viral (contra sarampo, caxumba e rubéola) e a pneumocócica (contra pneumonia, meningite e otite) – apresentaram adesão superior a 71%, que é menos do que os 80% desejados pelo PNI.
“O risco é acontecer com todas essas doenças, pólio, coqueluche, difteria, meningite, voltarem a causar doença e surtos entre nós. Foi o que aconteceu com o sarampo. Quando nossa cobertura começou a cair, a população de Roraima não vacinada gerou o surto de sarampo por lá e se espalhou pelo Brasil todo”, lamenta Isabella Ballalai, vice-presidente da SBIm (Sociedade Brasileira de Imunizações).
Ela chama atenção para o sarampo, que havia sido erradicado no Brasil, mas voltou a aparecer em 2018, fazendo com que a Opas (Organização Pan-Americana de Saúde) cassasse o certificado de país livre da doença concedido em 2016.
“Infelizmente, ninguém fez nada, e o país está até hoje com surto de sarampo e não conseguiu ainda eliminar 100% esse surto.”
Entre as vacinas que apresentaram maior queda está a da poliomielite, ou paralisia infantil. Em 1994, a doença foi considerada erradicada no Brasil e o último caso da doença foi em 1989. Porém, no ano passado, o índice de crianças vacinadas foi de apenas 67,58%, sendo que ele já chegou a 100%, em 2013.
Assim como a poliomielite, a varíola também foi erradicada no Brasil graças à vacinação.
No ano passado a Opas alertou para o risco de Brasil, Bolívia, Equador, Guatemala, Haiti, Paraguai, Suriname e Venezuela viveram a volta da doença.
A preocupação aumentou ainda mais após a confirmação de duas crianças infectadas em Jerusalém, Israel, na última terça-feira (16), e a presença do vírus no esgoto de outras cidades do País.
“Em Israel não foi o vírus selvagem que originou os casos. Foi o derivado da vacina. Isso sempre existiu, o vírus da vacina é atenuado, por ser uma vacina oral, ele é eliminado pelas fezes do vacinado. Essa eliminação ajudou na erradicação da pólio. No entanto, agora devido à baixa cobertura vacinal, esse vírus que foi para o ambiente e sofreu mutação e causa doença nos não vacinados”, alerta Isabella.
E acrescenta: “Os números que temos hoje de vacinados deixam o país suscetível à pólio, tanto a importada, por exemplo alguém que venha do Afeganistão ou Paquistão, onde o vírus selvagem circula, quanto o vírus vacinal que está entre nós pelos vacinados.”
O que causou a baixa adesão à vacinação?
Entre os motivos apontados para a baixa adesão é que os pais deixaram de conviver com as doenças evitáveis por vacinação e ter conhecimento da gravidade a que seus filhos estão expostos.
“O principal motivo é a perda da percepção de risco que há na população. Há um estudo que mostra que dos anos 1980 até 1994 tivemos várias campanhas de vacinação e a curva de cobertura vacinal aumentou muito rapidamente. Nos anos de 1995 até 2014, essa curva ficou estável, e de 2015 para cá essa curva cai.”
Para a vice-presidente da SBIm, as gerações de pais mais novos não têm a mesma percepção de risco que havia antigamente.
“Nos anos 1980, a população via essas doenças. Uma mãe, um pai tinham medo de que o filho pegasse pólio. 90% dos brasileiros acreditam na importância da vacina, mas eles precisam acreditar no risco da doença.”
As taxas de confiança nas campanhas de vacinação no Brasil chegam a quase 90%, de acordo com pesquisas da SBIm e nos momentos de surtos a população busca proteção.
“Quando a população vê a doença, ela procura a vacina”, diz a especialista ao lembrar do surto de febre amarela vivido no país em 2017 e 2018.
“Na época, tínhamos uma cobertura no país de 40% de vacinados, sendo que a vacina era recomendada de rotina na grande maioria do território e oferecida pelo SUS [Sistema Único de Saúde]. Quando tivemos a epidemia, até quem tinha contraindicação queria vacinar, foram filas, pedidos de laudos médicos para autorizar”, lembra Isabella Ballalai.
Pais não são únicos responsáveis pela falta de adesão
Outro motivo apontado pela SBIm é a falta de comunicação adequada para que tanto os pais quanto os médicos saibam das campanhas de vacinação, dos riscos das doenças e da importância de evitar a volta dessas enfermidades.
“A comunicação precisa fazer parte das ações do Ministério da Saúde, o que existia nos anos 1980 e 1990. Era uma festa vacinar. Agora a comunicação que a gente vê é, no máximo, chamar para vacinar. Mesmo assim, campanhas anuais que acontecem todos os anos têm adesão baixíssima, e muita gente nem fica sabendo que está acontecendo. A comunicação é apontada como principal ferramenta para o êxito da vacinação”, ressalta a médica.
Muitas vezes os pais são apontados como os responsáveis por levarem os filhos para vacinar, mas a médica diz acreditar que essa responsabilidade deve ser dividida com o poder público, já que a comunicação é falha.
“A responsabilidade maior é das autoridades públicas. Nem o nível federal, nem estadual, nem municipal têm feito qualquer comunicação sobre as outras vacinas e a situação de risco que o país vive hoje. Os pais são cobrados, porque os governos acham que explicam a importância da vacinação”, conclui Isabella Ballalai.
A SBIm disponibiliza no site quais são as vacinas indicadas para cada faixa etária, com indicação das que são oferecidas pelo SUS, de zero a 10 anos; de 10 a 19 anos; de 20 a 59 anos e acima dos 60 anos. As gestantes, os transplantados e os pacientes especiais também encontram as vacinas disponíveis e indicação para aplicação.
Fonte: OSul
Foto: Ministério da Saúde
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